Por falar constantemente de eutanásia com os grupos de formação, já vi o filme "Mar Adentro" de Alejandro Amenábar e li o conto "Alma Grande" de Miguel Torga tantas vezes que os sei de cor. Cada diálogo, cada frase. Cada plano, cada descrição. Ouvi pessoas de todos os quadrantes a mencionarem as duas obras nos últimos dias. Um é abertamente um filme panfleto, o outro foi instrumentalizado e descontextualizado pelo líder da bancada parlamentar do PSD. Fica bem um pouco de erudição num debate na casa da democracia mesmo que se mude o contexto histórico da era da Inquisição para "a primeira metade do século XX" e se deixe de lado a perseguição religiosa e a tortura para se colocar a fome e a miséria como móbil para a ação do abafador. Dá mais jeito para justificar o discurso político e convicções pessoais.
Aceito todos os argumentos contra a eutanásia mesmo que o meu respeito pela liberdade do outro me impele a aceitar que a vida lhe pertence, a ele mais do que à família e amigos. É uma questão de valores, para mim a Liberdade está acima da Vida. Os que deram a vida em nome da liberdade são vistos como heróis. Os que abdicaram da liberdade em nome da vida não são, justamente, cantados. Só dois argumentos não respeito, os fundados na ignorância ou na superstição. Em relação aos primeiros nem falo, quem os utiliza terá dificuldade em compreender-me e estaria a perder tempo. Em relação aos segundos, não posso aceitar que as crenças religiosas de um grupo, por mais numeroso que seja, sejam lei para todos. Podem ser leis para quem nelas acredita, é um direito dessas pessoas. Não posso é aceitar que façam do sofrimento um dever para todos.